A psicanalista Melanie Klein disse certa vez que são os delírios dos pais que formam a personalidade dos filhos. O pai olha para a filhinha recém-nascida no berço e diz: “Que gracinha! Vai ser juíza! Vai ser médica! Vai ser astronauta! Vai ser cientista! Vai ser presidente da República!” Nenhum pai olha para seu filho no berço e diz: “Que gracinha! Vai ser repositor de gôndola de supermercado! Vai ser operador de pare-e-siga!” Por favor, entenda corretamente meu ponto. Acho que ser repositor de gôndola de supermercado e operador de pare-e-siga são profissões tão dignas quanto médico e cientista, mas não acredito que algum pai deseje isso para o filho, a não ser que esteja em condições piores do que quem, empregado, exerce uma das duas profissões. Não é um projeto de vida ter um filho repositor de gôndola. É um trabalho árduo, repetitivo, com quase nenhuma interação social, monótono, que não torna a vida de ninguém mais completa, que não dá nenhuma satisfação em se fazer. Ao contrário, nós, pais, gastamos fortunas para garantir a nossos filhos escolas melhores que as que tivemos (não importa se é uma escola bilíngue nos Estados Unidos ou simplesmente uma escola pública municipal em uma comunidade violenta: sempre tentamos fornecer a nossos filhos experiências educacionais que achamos ser melhores do que aquelas que tivemos, na ilusão que nossa experiência limitada é um bom critério para escolher o que é melhor para os filhos).
É exatamente isso que faz com que amemos tanto os nossos filhos: investimos dinheiro, forças, tempo e, sobretudo, energia emocional neles, para que tenham uma vida melhor do que a nossa.
Há um filme antigo, uma comédia dos anos sessentas, chamada If a Man Answers(Se o marido atender…),com Sandra Dee e Bob Darin. Era uma vez uma garota, Chantal, filha de Richard e Germaine, família recém-mudada de Boston para Nova Iorque, onde a jovem conhece Eugene, com quem acaba se casando. O problema é que Eugene é fotógrafo, trabalha para calendários e vive rodeado por mulheres que são seus modelos. Para piorar tudo, o estúdio do rapaz é no próprio apartamento do jovem casal. As coisas não vão nada bem para eles, e Chantal resolve procurar sua mãe, Germaine, uma francesa que laçara Richard quando este visitou Paris, há muitos anos atrás. Germaine diz que sabe como resolver o problema, e que ela mesma passou por um problema semelhante com Richard quando se casaram. Ela descobriu um livro que ajudou muito a melhorar a relação deles. Chantal pergunta-lhe que livro é esse e Germaine responde que só revelaria se a filha prometesse nem rir nem revelar a ninguém que livro era aquele. Quando Chantal promete seu sigilo, Germaine vai até a estante, toma um livro e entrega à jovem: Como adestrar seu cão. “Como assim, mamãe?”, pergunta a garota, incrédula. “Exatamente assim, minha filha”, responde Germaine, “faça exatamente como o livro estiver falando. Apenas substitua o cachorro pelo seu marido. Aqui no livro diz que quando seu cachorro fizer algo certo, que você está se esforçando para ensinar-lhe a fazer, dê uma coçadinha atrás de sua orelha para recompensá-lo. E que, quando for sair com seu cachorro, ele vai tentar puxar você para ir aonde quiser. A princípio deixe ele pensar que ele conduz você, mas aos poucos vá diminuindo a guia, aproximando o cão para junto de você sem que ele perceba. Faça o mesmo com seu marido: quando saírem para fazer compras, deixe ele leva-la aonde ele quiser. Aos poucos, sem ele perceber, vá tomando conta da situação”. Chantal faz tudo o que o livro lhe pede para fazer, e tudo vai dando certo. Cada vez a relação entre eles é melhor, até que Eugene descobre que Chantal estava usando um livro de adestramento de cães para moldar o comportamento dele. Os dois, então, têm sua relação estremecida. Chantal procura sua mãe pedindo por novos conselhos, e a sábia Germaine (que realmente sabe tudo sobre o amor) lhe pergunta: “Minha filha, o que você acha que você estava fazendo?” Chantal responde: “Adestrando meu marido!” Germaine responde: “Não, minha filha, você não entendeu nada. Você não estava adestrando seu marido. Você estava seadestrando. Você estava se ensinando a recompensá-lo quando ele fazia algo que você apreciava! Você estava se ensinando que ele também precisa decidir aonde leva-la. Mas eu tenho uma solução para seu problema: consiga um amante. Eu mesmo fiz isso quando seu pai e eu tivemos problemas. Meu amante era um homem maravilhoso: Robert Swan!” Chantal grita: “Mamãe! Que horror!”, e Germaine responde “Não, minha filha, não era um amante de verdade. Era um amante imaginário. E, no fundo, seu pai também sabia que ele era imaginário. Mas como ele tinha um concorrente, ele se empenhava, fazia o máximo para me conquistar….” (Não se preocupe, há muita estória além disso, e tenho certeza que você vai adorar o filme).
Qual é a lição de Germaine? Quanto mais ela investia no marido, adestrando-o (ou seja, adestrando a si mesma), mais ela o amava. Quanto mais o marido investia em Germaine, mais ele a amava.
É interessante que essa também é uma lição do Apóstolo Paulo, na Bíblia. Pode ser que você pense que as ideais de Paulo estão cheias de pressupostos religiosos e de preconceitos que você não compartilha. Ou pode ser que que você pense que dificilmente alguém que foi solteiro e provavelmente virgem durante toda sua vida pode ensinar algo em termos do amor erótico, ou romântico. Mas eu vou pedir para você estar atento para o fato de que em todo lugar há sabedoria. Como diz um amigo querido, o professor Jacyntho Lins Brandão, “o mundo está cheio de sinais, e a sabedoria consiste em saber interpretá-los”. Paulo diz: quer uma mulher fiel? Ame-a primeiro (Epístola aos Efésios, 5:25). Amor responde a amor…
Pós-escrito: Amar alguém, investir em uma relação, não é garantia que a pessoa irá amá-lo também, que ela investirá na relação. Mas, se você vê que os investimentos que está fazendo não dão retorno, por que continua investindo?
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