Um dos livros mais importantes do pensamento filosófico moderno, a Fundamentação da Metafísica dos Costumes, de Immanuel Kant, quer investigar em que consiste a moral. Para que uma moral valha para todos os seres racionais, ela não pode se originar em nossa experiência, e, portanto, seu ponto de partida não pode ser os costumes em meio aos quais vivemos (e por isso uma melhor tradução para o título do livro seria Fundamentação da Metafísica da Moral).Uma ação, pensa o homem comum, só possui valor moral se for praticada independentemente de seu resultado. A razão pode fornecer a lei que rege tal ação apenas se esta lei for puramente formal. Nela, a razão comanda: “Age como se a máxima [ou seja, aquilo que sua razão, enquanto vontade empírica, deseja, a cão que ela prescreve subjetivamente] da tua ação se devesse tornar, pela tua vontade, em lei universal da natureza”. Isso significa que é a vontade que torna, pela sua pretensão a universalização, uma ação boa (ou correta), e não uma ação correta que torna a vontade boa.
Essa concepção da ação moral revela que a liberdade é essencialmente autonomia, sendo o homem ao mesmo tempo autor e destinatário de suas leis morais, o que só está correto se realmente for possível determinar a ação apenas sob a influência dessa lei, e não das inclinações (impulsos, paixões, instintos).
Há algo, no entanto, que não podemos compreender, diz Kant: por que é que a razão é assim, naturalmente legisladora? Para isso, deveríamos investigar a causa final do ser racional, e só podemos conhecer a causa eficiente de sua ação (ou da natureza), que se expressa em suas leis.
Para chegar à melhor tradução possível do texto alemão, Paulo Quintela a compara com várias traduções para o francês, Inglês e Espanhol, e de fato as soluções que ele dá a muitos trechos mais complicados é muito boa; o único problema é a insistência em pensar que Triebfeder só pode ser traduzido por móbil (mola propulsora), quando, algumas vezes, tem o sentido de motivo (objetivamente moral). Apesar da dificuldade do texto (paradoxalmente porque Kant tenta, sempre, ser muito claro, o que o obriga a muitas orações interpoladas e parênteses), a tradução é certamente a melhor tradução existente em Português. Apesar da sua dificuldade (é um texto para se ler lenta, atenta e refletidamente), é o texto de introdução ao sistema filosófico de Kant, e, portanto, incontornável.
Esta tradução consta também das três primeiras edições da coleção Os Pensadores (mas nelas sem à indicação das páginas da Akademieausgabe, edição padrão das obras de Kant em alemão, como consta nesta edição portuguesa).
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